Como as Economias Solidárias Ganham Força

O livro “Cidades Solidárias” traz um olhar sobre como as pessoas que vivem em sociedades capitalistas se viram para criar instituições econômicas baseadas na solidariedade ao invés do lucro e da competição.

Em cidades marcadas pelo capitalismo racial e exclusão econômica, as comunidades sempre lutaram para recuperar seu futuro através da solidariedade e cooperação. Mesmo nos momentos mais difíceis da história urbana capitalista, essa luta se torna ainda mais essencial diante do ressurgimento de uma supremacia branca patriarcal nos dias de hoje.

Pesquisas mostram um padrão interessante: aqueles bairros que foram deixados de lado há décadas, como os que sofreram com o redlining, agora estão florescendo com cooperativas de trabalhadores, financeiras comunitárias, hortas comunitárias e redes de ajuda mútua, formando um movimento vibrante de economia solidária.

Essas instituições da economia solidária estão surgindo principalmente em setores que atendem a necessidades humanas fundamentais, como alimentação, moradia, finanças e cuidados. Elas foram criadas por e para pessoas que historicamente foram excluídas do acesso a capital e oportunidades, especialmente nas comunidades negras, pardas e de baixa renda.

Essas iniciativas desafiam a lógica da extração racial, promovendo alternativas que priorizam a democracia econômica, sustentabilidade ecológica e prosperidade compartilhada.

Economias Solidárias

Uma lição clara aparece: quando os sistemas capitalistas falham em atender as comunidades, as pessoas dão um jeito de construir suas próprias instituições econômicas baseadas na solidariedade. Hoje, com os desafios do capitalismo racial se reorganizando rapidamente, as economias solidárias estão mais uma vez em destaque como uma forma de defesa comunitária contra essas forças.

É fundamental aumentar o número de instituições e fortalecer as ligações entre elas para aprofundar essa rede de solidariedade econômica.

O livro “Cidades Solidárias” tem como objetivo iluminar as dinâmicas de economias urbanas solidárias que, embora geralmente invisíveis nas narrativas econômicas tradicionais, estão presentes em grandes cidades como Nova York, Filadélfia e Worcester, onde realizamos nossas pesquisas.

A soma das histórias de iniciativas como hortas comunitárias, cooperativas de crédito, cooperativas de trabalhadores, cooperativas de habitação acessível entre outras, desafiam a ideia de que a urbanização sob o capitalismo racial resulta em espaços urbanos polarizados.

Vivemos uma realidade em que existe tanto áreas privilegiadas, destinadas a uma elite econômica e cultural, quanto bairros onde a pobreza afeta a maioria das pessoas, que lutam diariamente para sobreviver. Mas entre essas lógicas — que podem ser vistas como a Cidade Gentrificada e a Cidade Desinvestida — as instituições da economia solidária revelam uma terceira dimensão da vida urbana, organizada de maneira diferente, ancorada em ética de cooperação econômica, inclusão, mutualidade e justiça.

Essa terceira dimensão é o que chamamos de “Cidade Solidária”. Usamos essa ideia para destacar as relações de solidariedade que definem a vida urbana. Em termos simples, solidariedade é um sentimento de responsabilidade coletiva e propósito compartilhado que conecta indivíduos a suas comunidades. Estar em solidariedade significa ter um objetivo comum e estar disposto a fazer sacrifícios.

Para nós, a Cidade Solidária representa um presente repleto de uma economia cooperativa e um futuro desejado. Ela abrange múltiplos domínios sociais, desde o cuidado com os outros e o voluntariado até iniciativas em nível de bairro ou cidade inteira.

Nossa ênfase está no domínio econômico e nas práticas que formam e incluem um movimento de economia solidária global. Esse movimento busca criar uma economia voltada para as pessoas e para o planeta, combatendo a dominação do capitalismo. Assim, o livro discute como essas cidades solidárias se formam e os desafios que enfrentam para criar uma economia solidária pós-capitalista.

Mesmo que o foco seja a solidariedade na construção de cidades, também analisamos a marca duradoura do capitalismo racial nas geografias urbanas e como as economias solidárias podem transformar divisões raciais e econômicas profundas.

Esse interesse em alternativas solidárias ao capitalismo tem crescido rapidamente. Temos visto muita criatividade nas comunidades ao redor do mundo, criando iniciativas que priorizam valores éticos em vez de lucro. Nos últimos anos, a proliferação de hortas comunitárias, cooperativas e finanças comunitárias, bem como um interesse geral por democracia econômica, tem aumentado bastante.

Algumas dessas práticas são antigas, enquanto outras surgiram em resposta a crises econômicas, ecológicas e geopolíticas, que deixaram as populações mais vulneráveis e desconfiadas das instituições capitalistas. Novas ou antigas, muitas dessas iniciativas se baseiam em tradições culturais de ajuda mútua, que têm sustentado comunidades diante de várias formas de opressão.

Essas iniciativas, embora essenciais, acabam frequentemente ignoradas nas pesquisas sobre economia, que preferem focar em empresas com fins lucrativos e orçamentos estatais. Além disso, quando são estudadas, costumam ser tratadas de forma isolada — cooperativas de consumidores são analisadas separadas das cooperativas de trabalhadores, que são independentes das hortas comunitárias, e assim por diante.

Essa abordagem fragmentada reforça uma visão que considera o capitalismo como a única forma econômica dominante. Alternativas são vistas como exceções, marginalizadas na sociedade e muitas vezes ignoradas. Para quem busca alternativas ao capitalismo, essa visão torna difícil imaginar outras possibilidades.

Com este livro, queremos desconstruir esses modos de pensar, explorando as interconexões que existem quando diversas iniciativas são vistas juntas como partes de uma economia solidária que pode transformar as cidades e a vida urbana.

Se pudéssemos enxergar os exemplos ao nosso redor não como exceções, mas como elementos essenciais das redes de solidariedade que sustentam a vida urbana? O que se revela ao nosso olhar é uma vida robusta, onde várias iniciativas não capitalistas se interligam e formam o núcleo da Cidade Solidária.

Essa transformação na percepção das economias solidárias é fundamental para imaginarmos o que as cidades solidárias podem ser ou já foram. Não estamos escrevendo apenas para quem já faz parte do movimento de economia solidária, mas também para acadêmicos e leitores curiosos que talvez não conheçam bem esse conceito e que buscam entender sua importância.

Enquanto analisamos diferentes aspectos das economias solidárias em três cidades americanas, vale ressaltar que práticas de Cidade Solidária estão em todo o mundo, de Cochabamba na Bolívia a Cidade do Cabo na África do Sul.

Esses exemplos oferecem um modelo prático de experimentos que promovem a justiça e ajudam as comunidades a construir meios de vida, defender suas necessidades e resistir às forças do capitalismo racial, enquanto pavimentam o caminho para um futuro urbano mais justo, voltado para as pessoas e o planeta.

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